13 setembro 2013

The Walking Dead e Rousseau





Costumo dizer que por trás de tudo há filosofia, por mais que alguns de nós a renegue, ela está em nós. O homem é um ser filosófico por excelência, cada ato e cada decisão que tomamos são filosóficos em algum ponto, dá ideia que devemos punir nossos filhos quando erram ao ‘sim’ ou ‘não’ respondidos sobre determinado assunto estamos filosofando.
            


           Portanto a produção cultural exteriorizada através de filmes e séries não escapa a essa regra, por mais que a questão filosófica não esteja explícita, se mirarmos com sensibilidade veremos que ela vai estar lá. Considero como ótimos exemplos, a trilogia Matrix, o filme V de Vingança e a série Game of Thrones, embora hajam muitos outros exemplos, que poderíamos mencionar.

            Mas nos atenhamos a fazer essa análise relacionando a série The Walking Dead e a teoria do Contrato Social defendida por filósofos como Thomas Hobbes, John Locke e Jean Jaques Rousseau.
             
Rousseau

            Segundo a teoria do contrato social, a vida em sociedade possui um caráter contratualista. O homem em sua origem vivia em um estado natural, onde todos tinham direito a tudo, tendo como limite ao seu desejo a sua força, prevalecendo à lei do mais forte, de modo que o conflito era constante, por ocasionar o choque de interesses sobre a mesma coisa, se A queria algo e B também, o mais forte teria direito a ela.

            O homem era plenamente livre, e como já dito o limite de sua liberdade era a sua força. Em um determinado momento se percebeu que um grupo de indivíduos era mais forte do que um único indivíduo, portanto, quanto maior o agregado de forças, maior seria a liberdade do grupo, que assim poderiam se proteger mutuamente contra os inimigos externos e garantir a satisfação de suas necessidades em conjunto.

            Em razão da incerteza que havia sobre o seu próprio destino, em meio a batalhas constantes uns com os outros, a humanidade resolveu se socializar sob pena de extinguir-se caso continuasse a seguir o mesmo rumo, e muitos benefícios surgiram dessa convenção.
            E assim o homem abriu mão de uma liberdade natural ilimitada, por uma liberdade social que possuía como limite a liberdade de seu sócio contratante, saindo de um estágio natural de guerra, para um estágio social de convivência pacífica. Surgindo assim a figura do Estado como guardião desse contrato, devendo garantir a proteção de seus membros, havendo a necessidade de leis e punições contras as transgressões contratuais visando à manutenção e a preservação do contrato social.
            

          No mundo de The Walking Dead, ocorreu um apocalipse zumbi, que dizimou a maioria da população transformando-os em seres desprovidos de inteligência, em putrefação, movidos pela vontade instintiva de comer qualquer ser vivente. Os poucos que não sucumbiram, vivem uma luta diária e constante pela sobrevivência buscando recursos sobre os escombros do que restou, contra os zumbis e outros grupos de sobreviventes.

            Se olharmos sob a ótica da teoria do contrato social, poderemos concluir que ele não existe mais, pelo simples fato de boa parte de seus signatários terem se transformados em mortos vivos, o Estado que antes era o guardião desse contrato deixou de existir, não garantindo mais a proteção de seus integrantes e a possibilidade de manutenção de suas necessidades sociais básicas.

            Agora os poucos que restaram se unem em pequenos grupos que ora ou outra se vêm em um conflito de interesses, prevalecendo à vontade daquele que for o mais forte para impô-la aos demais, as antigas leis que antes regiam a vida em sociedade não tem mais valor, por terem perdido o caráter coativo que o Estado as revestia, e o que observamos literalmente na prática, é máxima de Hobbes, “O homem é o lobo do homem”.

            O estado de guerra foi restabelecido, e agora além lutarem contra os zumbis, os grupos lutam entre si, buscando a satisfação de suas necessidades, e o que se vê é um mini contrato social que se aplica no âmbito do grupo, que faz as suas próprias leis, baseando-se em seus valores morais adquiridos na vigência do contrato social anterior, mas até essa mini convenção é relativa devido à instabilidade que pode se configurar dentro do grupo dividindo-o ou dizimando o lado mais fraco.

            A série é baseada na HQ (História em Quadrinhos), e quem as acompanha vai conseguir vislumbrar nitidamente o que foi dito até o momento, o conflito entre pessoas que não abrem mão de seus valores e pessoas que vivem a frase “se está na selva, seja selvagem”. Estupro, assassinato, tortura, roubo... São coisas comuns nesse mundo, onde a única regra existente é a ausência de regras.

            Sempre aberto a possibilidade de estar enganado, vejo The Walking Dead, como uma reflexão sobre a sociedade em que vivemos e as regras que somos coagidos através das leis e das convenções sociais a seguir. Será que seguiríamos tais regras se não houvesse obrigatoriedade de segui-las? As pessoas são boas independente da situação em que vivam ou o são somente porque é socialmente correto?

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