17 julho 2010

Poema: Guerra Civil


Vinicius dos Santos/Juan Ricthelly
Eu tenho um sonho,
Que um dia esta nação se erguerá
E viverá o verdadeiro significado
De seus princípios.
Nós acreditamos que esta verdade
Seja que todos os homens são iguais.

Eu tenho um sonho,
Onde todas as crianças viverão
Em uma nação onde não serão
Julgadas pela cor de sua pele,
Mas sim pelo conteúdo de seu caráter.

Gostaria de viver bastante,
Pra ver um mundo sem guerra,
Sem miséria e sem racismo.

Olhe, Olhe só!
Olhe seu jovem homem morrendo!
Olhe sua mulher chorando!
Olhe seu jovem homem lutando!
Da maneira que sempre foi antes...

Olhe, Olhe só!
Olhe o ódio que estamos cultivando!
Olhe o medo que estamos alimentando!
Olhe as vidas que estamos sacrificando!
Da maneira que sempre foi antes...

Minhas mãos estão atadas,
Os milhões crescem lado a lado
E pessoas continuam matando por paz,
Pelo “amor” de Deus e dos “direitos humanos”.
Por mãos sangrentas que o tempo não nega
E são lavadas pelo nosso próprio conformismo.
Enquanto as emissoras de rádio e televisão
Fabricam mentiras que escondem e manipulam a verdade.

Você veste uma braçadeira preta
Quando eles atiram em um homem.
Quando você diz: “A paz poderia ser eterna”.
Arrastam crianças pelo asfalto.
E quando você grita: “Não a violência!”
Filhos assistem à morte dos seus próprios pais.


Eu não me ceguei quando não pude enxergar,
Que você não pode confiar na liberdade
Mesmo estando ela em suas mãos.

Eu não preciso de uma guerra civil,
Ela alimenta os ricos e enterra os pobres.

Olhe, olhe só!
Olhe os tênis que você está calçando!
Olhe o sangue que estamos espirrando!
Olhe o mundo que estamos matando!
Da maneira que sempre foi antes...

Olhe, olhe só!
Olhe a dúvida que estamos criando!
Olhe os líderes que seguimos!
Olhe as mentiras que contamos!
Eu nem quero mais ouvir...

Minhas mãos estão atadas,
E tudo o que eu vejo tem mudado a minha mente
Toda essa merda continua rolando e os anos passando
Nada muda.
Nem por amor a Deus ou pelos direitos humanos.
Meus sonhos foram varridos de lado
Por mãos sangrentas do hipnotismo
Por mãos que carregam a culpa do homicídio
Gradativo da sociedade.

Nós praticamos a nossa seletiva aniquilação
Quando elegemos nossos oficias de governo.
E quando pensamos que a paz está próxima
Sentimos um vácuo:
Na saúde, na segurança e na educação.
E sobram os pobres que ao irem trabalhar
Só podem contar com a proteção de Deus
E tudo o que pedem é para que
Não sejam agredidos na espera do ônibus.

Todos os homens são iguais!
E o que me preocupa
Não é o grito dos violentos.
E sim o silêncio dos bons.

Talvez um dia nossas crianças
Viverão numa nação onde não serão
Julgadas pela cor de sua pele
E sim pelo conteúdo do seu caráter.
Pois ainda hoje, mesmo depois de tanto tempo.
O homem negro ainda não é livre
Sua vida é tristemente invalidada
Pelas algemas do preconceito
E pelas cadeias de discriminação.
O homem negro vive em uma ilha só de pobreza
No meio de um vasto oceano de prosperidade material.

Meu Brasil! Doce terra de liberdade, eu te canto.
Terra do orgulho dos peregrinos.
De norte a sul, de leste a oeste,
Ouço o sino da liberdade.
E se tu és uma grande nação,
Isto tem que se tornar verdadeiro.

Aí sim, ouvirei o som da ordem e do progresso
No extraordinário coração de todos os brasileiros.
Ouvirei o som da esperança, no sorriso de nossas crianças.
Ouvirei o som da felicidade, no olhar de nossas mulheres.

E não é só isso,
Ouvirei o som liberdade de norte a sul.
Ouvirei o som da igualdade de leste a oeste.
Ouvirei o som da fraternidade
Em todos os morros e favelas
Desse teu imenso território
Que é gigante pela própria natureza,
Que é belo, forte, impávido e colosso.

E quando isto acontecer,
Quando permitirmos os sinos soarem.
Em toda moradia, em todo vilarejo,
Em todo estado e em toda cidade
Nós poderemos acelerar a chegada do dia,
Em que todos os filhos de Deus,
Homens pretos, brancos, pobres e ricos
Poderão cantar juntos a mesma música:
“Livre afinal”...


Esse poema tem um significado especial para mim, ele fez parte do melhor trabalho que eu já fiz em minha vida escolar e foi feito em parceria com um grande amigo que infelizmente não está mais entre nós. Lembro que tudo começou quando um grupo de alunas estava desenvolvendo um projeto para a turma apresentar no "Café com poesia 2007" do CEM 02 do Gama, a idéia delas era melancólica e deprimente com uns poemas tristes e músicas igualmente tristes como plano de fundo sem nenhum impacto especial, acho que a professora de português não gostou muito da idéia, mas ela estava num mato sem cachorro porque era o único projeto que a turma tinha sendo que não havia outro para rivalizar com ele, até que um dia antes de ir embora a professora chegou gentilmente em mim e perguntou se eu não tinha uma boa idéia de projeto, e eu respondi que no momento não tinha, mas que iria pensar, ela me deu aquele olhar silencioso, mas que dizia sem necessidade de uma única palavra: "Por favor, pense em alguma coisa, eu imploro."
Passou um tempo e num belo dia estávamos eu e mais dois amigos (Joseph e Vinicius) comentando sobre o quão estranho era o projeto de nossa turma e eu comentei com eles sobre o que a professora havia dito. E o Vinicius simplesmente disse: "Cara porque você não disse antes? Será que ainda dá tempo?". E instantaneamente começamos os três a bolar um projeto, a idéia principal era misturar poesia e rock n´roll, fomos acertando cada detalhe teve uma hora que até malabaristas cuspindo fogo pro alto foram incluídos a idéia, levamos uma semana mais ou menos para deixarmos tudo pronto, o Vinicius deu a idéia de misturarmos um discurso de Martin Luther King Jr. com a letra da música Civil War do Guns n´Roses e decidimos que a música de plano de fundo seria Civil War e depois tivemos a idéia fazer um medley incluindo Madagascar também do Guns (até hoje tenho esse áudio). Vinicius e eu fizemos a junção da letra com o poema e adicionamos muitas coisas à realidade brasileira e a alguns fatos chocantes que tiveram grande repercussão na época, o caso João Hélio, a empregada doméstica agredida no ponto de ônibus por pit boys, crianças que viram os pais morrerem na sua frente... Mencionamos a imprensa, a violência urbana, a guerra, o racismo, a fome e no fim exaltamos o nosso amado país como que sonhando com o dia em que tudo terminaria bem. Então o mais importante estava pronto e levamos para a escola para apresentarmos a turma, pegamos um som emprestado na direção colocamos a música para rolar dividimos o poema em três partes iguais e apresentamos, ouviam com cara de espanto e chocados, mas de uma forma boa. Depois que terminamos fomos aplaudidos por todos e todos queriam participar e o projeto anterior foi esquecido (as autoras não gostaram muito).
Dividimos o projeto em comissões de finanças, áudio, comunicação... E teve até testes pra ver quem participaria diretamente da declamação e ensaiamos repetidas vezes.
Modéstia parte o trabalho final ficou excelente, teve bandeira do Brasil descendo no meio do palco, bandeira dos EUA sendo jogada no chão (a platéia amou essa parte) e Imagine do John Lennon sendo cantada ao vivo no violão em português e em inglês, todos estavam caracterizados como pessoas vitimas da guerra e da violência e uma das horas mais empolgantes foi quando o Vinicius fez a abertura com a sua voz de locutor e sem camisa na frente de toda a escola, a mulherada gritou demais, só ouve alvoroço maior quando terminamos e recebemos os aplausos finais. Sem mencionar os slides de Power point que ficaram ótimos terminava com um poema que dizia:

Quando eu nasço, sou preto
Quando eu cresço, sou preto
Quando eu fico no sol, sou preto
Quando eu tenho medo, sou preto
Quando eu estou doente, sou preto
E quando eu morro, continuo sendo preto
E você, cara branco,
Quando você nasce, você é rosa
Quando você cresce, você é branco
Quando você fica no sol, você é vermelho
Quando você fica no frio, você é azul
Quando você tem medo, você é amarelo
Quando você fica doente, você é verde
Quando você morre, você é cinza
E você ainda vem me chamar "de cor"???

Firas Chadli

Infelizmente não conseguimos filmar e nem mesmo tirar fotos desse trabalho antológico, a professora chegou a chorar no fim quando viu o seu nome na dedicatória, sinceramente acho que essa foi uma das melhores apresentações que o auditório daquela escola já viu se não for a melhor, eu queria poder viver tudo aquilo de novo. Dizem que quando morremos vemos os melhores momentos de nossas vidas passarem diante de nossos olhos numa fração de segundos, se isso for verdade espero poder ver o Café com poesia 2007 na integra. Claro que tem muito mais detalhes que omiti, mas acredito que os mais notáveis foram mencionados.

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