30 julho 2010

MÚSICAS QUE FALAM POR MIM: ÁGUAS DE MARÇO


Ultimamente acho que me tornei mais observador e sensível a certas coisas que antes passavam despercebidas por meus olhos e simplesmente batiam e voltavam em meu coração, mas que no fundo sempre estiveram visíveis a todos. Acho que desde que comecei a escrever com regularidade a minha visão sobre o mundo mudou e conseqüentemente eu também.
Comecei a admirar a simplicidade de tudo, da vida, das coisas, das pessoas... E de repente parece que tudo ficou mais belo de uma forma que nunca foi antes, até coisas que antes eram idiotas mudaram. A verdade é que estamos cercados de beleza e coisas boas por todos os lados, e em momento algum paramos para observar com sensibilidade.
Eu sei que posso estar parecendo um louco ou um idiota por estar falando isso e se você pensa assim pare de ler e vá fazer outra coisa, porque provavelmente não vai entender nada do que estou querendo dizer.
Tem uma música que amo muito e que muitas pessoas escutam e dizem não entender o que ela diz, eu particularmente demorei um pouco a entender também, ela se chama “Águas de Março” e é de Tom Jobim e Elis Regina. E essa canção expressa bem e vai ajudar chegar ao ponto em que pretendo:

É pau, é pedra, é o fim do caminho
É um resto de toco, é um pouco sozinho
É um caco de vidro, é a vida, é o sol
É a noite, é a morte, é o laço, é o anzol

É peroba do campo, é o nó da madeira
Caingá, candeia, é o MatitaPereira
É madeira de vento, tombo da ribanceira
É o mistério profundo, é o queira ou não queira

É o vento ventando, é o fim da ladeira

É a viga, é o vão, festa da cumeeira
É a chuva chovendo, é conversa ribeira
Das águas de março, é o fim da canseira

É o pé, é o chão, é a marcha estradeira
Passarinho na mão, pedra de atiradeira
É uma ave no céu, é uma ave no chão
É um regato, é uma fonte, é um pedaço de pão

É o fundo do poço, é o fim do caminho
No rosto o desgosto, é um pouco sozinho
É um estrepe, é um prego, é uma ponta, é um ponto
É um pingo pingando, é uma conta, é um conto

É um peixe, é um gesto, é uma prata brilhando
É a luz da manhã, é o tijolo chegando
É a lenha, é o dia, é o fim da picada
É a garrafa de cana, o estilhaço na estrada

É o projeto da casa, é o corpo na cama
É o carro enguiçado, é a lama, é a lama
É um passo, é uma ponte, é um sapo, é uma rã
É um resto de mato, na luz da manhã

São as águas de março fechando o verão
É a promessa de vida no teu coração

É uma cobra, é um pau, é João, é José
É um espinho na mão, é um corte no pé

São as águas de março fechando o verão,
É a promessa de vida no teu coração

É pau, é pedra, é o fim do caminho
É um resto de toco, é um pouco sozinho
É um passo, é uma ponte, é um sapo, é uma rã
É um belo horizonte, é uma febre terçã

São as águas de março fechando o verão
É a promessa de vida no teu coração
pau, pedra, fim, caminho
resto, toco, pouco, sozinho
caco, vidro, vida, sol, noite, morte, laço, anzol

São as águas de março fechando o verão
É a promessa de vida no teu coração.

Eu a ouvi várias até finalmente entender, até que um dia estava tocando-a para um amigo no violão enquanto ele a ouvia pensativamente e quando eu terminei ele olhou pra mim com uma cara de quem não entendeu nada e disse: “Cara é muita coisa! Sério mesmo.” Na hora ri muito e depois parei pra pensar, que a maioria dos versos começavam com é alguma coisa ( É pau, é pedra, é o fim do caminho...) E comecei a me perguntar: É o quê? Não obtive a resposta na hora, passou um tempo até eu começar a me sentir como disse no primeiro paragrafo e entender que a música falava sobre a beleza que havia na simplicidade de coisas da vida e do dia a dia que nós nunca paravamos para reparar.
E comecei a ver beleza em tudo, no céu, luar, no sol, nas estrelas, num caco de vidro, num resto de mato na luz da manhã, nas nuvens e até em cada pessoa que convive comigo ou passa por mim na rua. Até o ar gelado que respiro, o vento batendo em minha face enquanto pedalo de bicileta, o abraço que dou em alguém que amo, o bom dia que dou a um desconhecido na rua, a canção que toco ao violão... Tudo que antes era rotina e banalidade se trasnformou em dadiva divina.

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