03 janeiro 2013

Felizes para sempre?



 E foram felizes para sempre...
            Geralmente é assim que quase toda grande história termina, pelo menos até a parte onde os contos de fadas e comédias românticas demonstram. Não sabemos o que vem depois disso, ou na verdade até sabemos, mas preferimos acreditar que eles realmente foram felizes para sempre.
            Então vamos à história de verdade!
            
             Um celinho sem sal a tirou de um sono profundo, que havia sido causado por uma meia mordida em uma maça envenenada por sua madrasta, que a queria morta para ficar com a sua parte na herança e não por ela ser mais bela como todo mundo acredita, porque na verdade a madrasta era mais gostosa e melhor de cama que a virgem e BV Ana Snow White, conhecida como Branca de Neve.
            Depois daquele celinho e do ‘And They Lived Happily Ever After’, Ana se casou com George Prince, sem ao menos o ter namorado por algum tempo para ver se realmente gostava dele ou para conhecê-lo melhor, afinal ela era uma princesa de um famosíssimo conto de fadas, seria contra o protocolo tal atitude, os Sete Anões ainda tentaram alertá-la sobre como os homens eram, mas ela não quis ouvi-los, porque afinal George era o príncipe encantado que chegou em um lindo cavalo branco e a salvou da bruxa má.
            O casamento foi lindo e cheio de glamour, para ser mais exato foi a altura da Branca de Neve, se vocês quiserem uma ideia aproximada da realidade digo a vocês que foi algo comparável ao casamento de Kate e William da Inglaterra.

Todas as outras princesas e príncipes encantados ou não encantados compareceram. Ariel e o Rei Tritão levaram lindas perolas como presente, Jasmin acompanhada de Aladin e do seu pai O Sultão de Acraba levou joias maravilhosas e belas tapeçarias, Fiona e Shrek presentearam o casal com vários animais exóticos do longínquo Reino de Tão Tão Distante, a Bela da Fera contribuiu com lingeries magníficas que fariam múmias levantarem de suas tumbas, a Bela Adormecida apesar de seu problema de narcolepsia levou utensílios domésticos primorosos, dentre convidados tão ilustres e tantos outros que não mencionei, a única que não esteve presente foi Cinderela por ainda ser a Gata Borralheira, apesar de a mesma ter implorado à Fada Madrinha que arranja-se uma hora nos salões que estavam lotados, uma carruagem mesmo estando todas alugadas e um convite de última hora, problemas que não existiriam se já conhecesse o seu príncipe que havia sido convidado e tinha direito a uma acompanhante.

A festa durou uma semana inteira regada a muita cerveja e hidromel, comida não foi um problema, pois todos comeram e beberam até ficarem extasiados. Houve princesas que se excederam e acabaram participando de uma verdadeira orgia se entregando a cavalariços, estalajadeiros e alguns soldados, os príncipes também não ficaram de fora, um deles que não vou citar o nome, participou de um ménage à quatre com as irmãs de Cinderela que compareceram, aconteceu um verdadeiro bacanal onde swings aconteciam com mais habitualidade que a aurora e o crepúsculo.

Na noite de lua de mel George estava muito bêbado e não conseguiu consumar o seu casamento com Ana que se sentiu profundamente frustrada ao ouvir os gemidos de outros casais pelo castelo. A consumação aconteceu no outro dia de manhã logo depois de George vomitar na latrina do quarto e não foi nada do que Ana sempre esperou, com pétalas de rosas vermelhas espalhadas pela cama, velas aromáticas, palavras de amor e carinho e uma noite inteira em claro, ela queria ter feito amor e não simplesmente sexo, George não durou três minutos e também não deu a devida atenção as preliminares e a dor que Branca de Neve sentiu ao ter o seu hímen bruscamente rompido.
Depois da festa todos foram para suas casas, deixando um mar de garrafas e roupas intimas espalhadas pelo castelo, levando consigo alguns bastardos no ventre e algumas doenças venéreas recém adquiridas. E então o casamento de verdade começou, Ana estava esperançosa de que as coisas melhorariam e de que o seu príncipe encantado se apresentaria como tal com o tempo, vai ver ele estava nervoso com a nova vida de casado.
No primeiro beijo de língua em George, ela achou o beijo ruim, só não sabia se o problema era o fato de nunca ter beijado alguém antes ou se ele beijava mal mesmo. A questão é que George foi um marido sexualmente ativo no primeiro ano de casamento, ela só achava estranho e repetitivo o mesmo papai e mãe de sempre sem nenhuma variação, mas como era uma moça inexperiente não reclamou.
No começo do segundo ano de casamento o primeiro filho chegou, depois de algumas reclamações sobre a possível esterilidade de Branca de Neve e os problemas conjugais continuaram.
George saia para caçar com outros príncipes e chegava a passar meses longe do castelo e de Ana que só não se sentia mais só por ter um filho para cuidar. No final de cinco anos eles tinham três meninos e uma menina que haviam sido feitos em noites raras de desempenho sexual insatisfatório.

Ana havia engordado alguns quilos, seus seios haviam caído depois de muita amamentação, haviam surgido algumas varizes e celulites, mas ainda possuía a sua beleza ímpar. Sua vida sexual havia se reduzido a uma transa no escuro a cada seis meses quando George estava suficientemente bêbado e disposto para tanto.
Ela havia conversado com outras princesas para saber se as coisas eram realmente daquele jeito com todos ou se o problema era só com ela, e ficou surpresa ao ver que os casamentos das outras princesas com príncipes encantados não eram muito diferentes do seu, a diferença era que uns traíam abertamente, outros agrediam suas esposas, outros eram impotentes e outros eram um pouco de cada coisa somadas a mais uma porrada de outras coisas. Uma das únicas exceções que conheceu foi solteira e libertina princesa Merida, que era excelente arqueira e um dia havia comido no jantar uma rã que havia falado com ela dizendo que era um príncipe encantado, que a faria feliz para sempre se ela o beijasse. Ela ria toda vez que contava essa história. As outras princesas eram proibidas por seus maridos a falarem com Merida A Ruiva, por a considerarem uma má influência, mas Ana gostava de sua companhia e de seu jeito despojado e espontâneo.

Havia boatos de que George a traia com algumas camponesas e de que havia sido amante de sua madrasta, mas toda vez que Ana tentava conversar a respeito George saia e passava meses fora caçando, uma vez quase chegou ao ponto de agredi-la, sendo impedido pela criança que ela amamentava na hora.
Num dia depois de conversar com Merida, Ana resolveu segui-lo na próxima vez que ele voltasse de suas caçadas e resolvesse caçar novamente.
-Você vai esperar mais ou menos dois dias depois que ele chegar, e vai tocar nesses assuntos que o chateiam, então ele vai resolver caçar e vai partir imediatamente, só que você já vai deixar tudo pronto só para segui-lo, não se esqueça de chamar um dos Sete Anões para te ajudar, pois eles conhecem a floresta melhor do que ninguém, eles saberão segui-lo. Entendido Branca?
-Sim, Merida, muito obrigada pela sua ajuda...
-Não há de quê Ana, você tem que largar de ser besta. Já pensou e conhecer outro homem? Tem tantos caras comuns por aí que dão de 10x0 nesses ‘príncipes encantados’, que de encantados não tem nada.
-Claro que não, que horror! Apesar de tudo, trair George nunca me passou pela cabeça, eu o amo.
-Fico triste em ver a lendária Branca de Neve numa situação tão deplorável. Mas um dia você acorda!
-É que eu só tive George na minha vida, nunca beijei ou fiz qualquer coisa com outro que não ele...
-Há quanto tempo vocês não transam?
            -Hum... Que pergunta intima!
            -Responde! Deixa de ser besta! Isso é algo normal.
            -Uns oito meses.
            -Meu Deus do Céu! Como você dá conta? Puta que pariu! Oito meses??? Eu já o teria traído sem pensar duas vezes.
            -O casamento é assim mesmo.
            -Não vou falar mais nada, vamos fazer como combinamos e depois vemos o que fazer.
            Como o combinado George voltou depois de três semanas de mais uma caçada e Ana foi abordá-lo sobre as mesmas questões que o irritavam, como o previsto ele foi para outro quarto e saiu de manhã cedo sem dizer adeus. Ana montou o seu cavalo selado e partiu com Zangado ao seu lado, que por cautela resolveu dar um tempo de distância para não serem descobertos por George.
Cavalgaram mais ou menos três horas até a floresta West Wood sem dificuldade, pois Zangado a conhecia como o gorro em sua cabeça. Chegando a floresta começou o trabalho de rastreamento que os levou próximo a um riacho, onde havia uma única barraca e dois cavalos grandes e bonitos pastando, sendo um deles o de George.
            Eles se aproximaram vagarosamente sem fazer ruídos ficando atrás dos arbustos observando a uma distância que dava para ver e ouvir nitidamente. Eles viram o que parecia ser outro homem dizer.
            -Achei que você ia demorar mais dessa vez...
            -Eu até ia, mas Ana começou a encher o saco e resolvi voltar imediatamente.
            -Eu já estava até arrumando as coisas para voltar, afinal também tenho uma esposa, tem um tempão que não vejo Rapunzel e ela está esperando um filho.
            -Pensei que você ia ficar feliz em passar mais um tempo comigo.
            -É claro que eu adoraria, mas não é isso, você sabe...
            -Sei o quê?
            George foi se aproximando do outro homem que o observava atentamente e Ana não pode acreditar no que via, os dois estavam se beijando carinhosamente de um jeito que George nunca havia a beijado, ela entrou em desespero, era como se o seu mundo estivesse desabando, ela queria bastante que aquilo fosse um pesadelo ou uma piada de mau gosto, Zangado não conseguiu esconder a sua indignação e ficou muito zangado com aquilo, até que Ana saiu bruscamente dos arbustos gritando histérica.
            -Que porra é essa? George?
            A primeira reação de George foi de completo espanto.
-Fodeu! – respondeu o outro homem.
-Então era isso o que fazia toda vez que vinha caçar? Era isso o que você caçou todos esses anos?
            -Calma Ana eu posso explicar...
            -Você não pode explicar porra nenhuma, porque essa merda não tem explicação. Príncipe encantado que nada, você não passa de um homossexual, ruim de cama que vive de aparência. Faça o favor de não voltar nunca mais naquele castelo.
            -Espere me desculpe!
            -Maldito Walt Disney!
            Ela deus as costas e saiu com Zangado que apesar de muito zangado assistiu aquilo calado, mas dizendo entre os dentes.
            -Quem diria hein...
E eles não foram felizes para sempre...

Dom Juan Ricthelly. Gama-DF, Janeiro de 2013.

Um comentário:

  1. Sensacional! Uma dura crítica a realidade, sem deixar de ser original e de nos despertar o senso crítico.
    Ezequiel Honorato

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