Vejo
pessoas correndo desorientadas, em meio a fumaça, enquanto uma muralha avança
impiedosamente, esmagando tudo e todos que estiverem ao seu alcance, não se
importando se é homem, mulher, criança, velho, jovem ou idoso. A ordem é
garantir a ordem a qualquer custo, mesmo que para isso tenha que se causar uma
desordem maior ainda.
Ouço gritos por todos os lados, em
tons tão distintos quanto o de uma orquestra, sendo que nessa os maestros são
em um contingente superior aos espectadores que participam diretamente, sendo
orientados por bastões, que atingem os seus corpos inertes perante a melodia do
terror, que é temperada com pitadas de bombas e mais bombas de gás,
proporcionando uma cena marcante nesse espetáculo onde a 'ordem' é a
homenageada do dia em detrimento de direitos e garantias fundamentais.
Sinto o cheiro da violência no ar e
meus olhos ardem ao ponto de lágrimas caírem rumo ao chão já refrescado por
jatos d'água e corpos caídos em uma úmida agonia. Minhas narinas ardem, meu
corpo se contorce, tosse é consequência, e quando pergunto ao responsável o
porque de tudo aquilo, ele prontamente me responde com um sorriso cínico
"Filo porque quilo!"
As cenas são fortes e os
protagonistas mais ainda, querem um filme digno do Oscar da Barbárie, tendo
como diretores seus superiores e governadores, ganha àquele que atuar com mais
ação, e eles são muito competitivos. Sendo instruídos a responder quando
esquecerem a fala: 'estamos apenas cumprindo ordens', essa é infalível, se enquadra
em qualquer cena, não abrindo mão da arbitrariedade para agir da forma que
achar melhor, podendo ficar em silêncio como Charles Chaplin.
É claro que alguns animais não
poderiam ficar de fora, afinal recursos não faltam para o figurino, os carros,
helicópteros, cavalos e cães treinados para brincar com qualquer um que estiver
a sua vista ao simples som de um 'pega esse filho da puta', recursos que por
curiosidade vêm das pessoas que agora correm em direção ao nada, por razão do
instinto inato de preservação da integridade física e moral que falta ao lado
que tudo tem, menos o respeito pela dignidade da pessoa humana.
Os cinegrafistas não perdem um único
segundo da mais nova produção nacional extremamente realista, Tropa de Elite 3,
deixando os atores principais irritados quando captam uma cena que consideram
desnecessária, atacando e incluindo-os compulsoriamente ao ilustre elenco desse
longa metragem, que tem como cenário o país inteiro. Ora ou outra recolhem
alguns figurantes de forma abrupta, para que as cenas fiquem mais picantes.
No dia seguinte os organizadores,
parabenizam publicamente a produção pelo excelente trabalho com os efeitos
especiais e aos atores que agiram exatamente dentro do roteiro, assim como
foram doutrinados a fazer, embora alguns críticos insistam em questionar tal
atuação, dividindo o público entre os que aplaudiram e os que repudiaram juntos
com aqueles que gritaram 'independência ou morte' no meio da cena deixando o
roteirista chateado.
Insistem em dizer que tudo foi em
nome da ordem pública, e que excessos não foram de forma alguma cometidos, o
que vimos de forma notória e indiscutível é que a violência estatal é um
'serviço público', mais eficiente do que a própria segurança pública. Lembrando
à todos que a última vez que alguém agiu em nome da ordem, ela durou duas
décadas, sendo garantida como valor máximo a ser alcançado.
Em nome da ordem, amém!
JUAN RICTHELLY
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